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09/11/2016

Talvez, o sempre, mas ainda talvez

Nós do Colégio Pentágono temos a certeza de que crescer não é tarefa fácil; dói, machuca, desafia. Para boa parte dos jovens, o momento que primeiro escancara as responsabilidades da vida adulta é aquele em que eles devem definir uma carreira, escolher uma faculdade, estudar, passar no vestibular. É algo muito intenso: são jovens, pouco amadurecidos, precocemente assumindo compromissos muito definitivos. Como decidir o que fazer, para sempre, no auge dos 17 anos?

Vivemos no tempo das urgências: urgência em crescer, urgência em estabelecer-se, urgência em decidir. Não temos mais o tempo necessário para a maturação dos desejos. Pior: não nos é dado o direito maior do crescimento – a possibilidade do erro, do engano, do recomeço. Em vez de percebermos os fracassos como as molas que nos impulsionam, vemos o fracasso como aquilo que nos define indivíduos pouco realizados, infelizes, despreparados.

Na liquidez da sociedade, de Bauman, reside também nossa incapacidade para administrar o que machuca, por acostumarmo-nos ao prazer constante e a uma inabilidade em ser contrariado, ou ainda, em preservar as relações, cuidando delas, insistindo, não as descartando. Assim, o vestibular, e tudo o que ele representa, suscita as angústias de um possível fracasso, além da dificuldade em comprometer-se: se tudo é fluido, como é possível decidir, em tenra idade, aquilo que definirá a vida?

Viver o vestibular é ser impulsionado ao sempre em uma sociedade marcada pelo talvez. Essa idiossincrasia, por si só, já torna o momento deveras inquietante. Para além disso, é preciso considerar a juventude dos que enfrentam esse momento. Mais que isso: como educadores, precisamos lembrar o que foi para nós esse momento, ainda que em outro tempo, com outras marcas. Defendemos, em nossas aulas, o exercício constante da alteridade, mas somos ineficazes ao exercitá-lo nós mesmos. Olhamos nossos alunos como máquinas programadas para crescer em data certa: este ano, no Enem, o primeiro grande vestibular, nos dias 05/11 e 06/11.

Esquecemo-nos de que não é assim, e não deve ser mesmo. Esquecemo-nos de conceder a eles um ombro que ampare o medo, um colo que diga que tudo vai ficar bem, uma boca que afirme que não há problema não conseguir ou mudar de ideia quanto à carreira. No auge dos 17 anos, é mesmo um problema começar uma carreira e descobrir-se impróprio para ela? É mesmo tão ruim ter de fazer vários vestibulares até ingressar na instituição de maior desejo? Colocamos sobre o jovem o peso de uma decisão que, na prática, não há – nem pode haver.

É preciso olhar para o adolescente nesse período com profunda empatia e com a habilidade sincera de um olhar que afirme: “está tudo bem, vai ficar tudo bem. A você cabe apenas lidar com isso da melhor forma e com seriedade, valorizando o processo, vivenciado, com vigor, a experiência; faça o seu melhor, sempre, e tudo quedará bem”.

E como é difícil: somos engolidos pelo mesmo mundo e impelidos a uma cobrança que escraviza. Somos também nós, educadores, habitantes do mundo da urgência e da definição – ainda que líquida – do futuro. Na lógica de Brás Cubas – “matamos o tempo; o tempo nos enterra” – esquecemo-nos do respeito ao tempo de maturação, atropelamos os processos e desaprendemos a errar, prática essencial. Depois, passamos boa parte de nossa iniciação adulta a aprender que, no fim, fracassamos. E que bom: porque é assim que crescemos e somos capazes de alcançar nosso máximo patamar. O aprendizado real está na habilidade de recomeçar, de reinventar-se. É assim que devemos olhar para o vestibular – professores, escola e vestibulandos – com olhos de porvir, com esperança, com a certeza de que não importam os resultados, mas a convicção de fazermos o melhor – este o verdadeiro compromisso que devemos ensinar nossos jovens a assumir.

Thais Rosa Viveiros
Professora de Gramática e Redação do Colégio Pentágono
Coordenadora de Redação do Ensino Fundamental II e Médio
Coordenadora de Procedimentos de Leitura do Ensino Fundamental II
Coordenadora de Gramática do Ensino Médio