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14/12/2016

A sala de aula: uma lição de coisas

Munido de uma singular maturidade poética, Carlos Drummond de Andrade afirma, no poema inaugural do seu livro Lição de coisas (1962), que a palavra é “um ser / esquecido de quem o criou; flutua, / reparte-se em signos […] / para incluir-se no semblante do mundo”. Não bastasse a beleza dessa definição, o poeta mineiro, ao dizê-la, abre caminhos os mais diversos para que o leitor mergulhe na região cinzenta que existe entre o concreto e o abstrato, entre a forma e o conteúdo, entre quem disse e o que foi dito.

É verdade que todos nós lidamos, diariamente, com definições, já que o pensamento científico e os modelos mais tradicionais de educação exigem que saibamos definir tudo o que está ao nosso redor. Seria importante, portanto, sob essa perspectiva, entender as coisas para poder conhecê-las e para que tivéssemos, posteriormente, condições de lidar com elas.

Entretanto, quando se trata da sala de aula, é inevitável que, vez por outra – também como o gauche drummondiano –, encontremos algumas pedras no caminho. Ou seja, se a palavra é realmente essa entidade flutuante que imprime por aí os seus mais diversos significados, como fica o papel do professor? E o dos alunos? E a aula? Pensando nessas questões, urge evocarmos, novamente, a expressão máxima das palavras: a poesia.

No Colégio Pentágono, as aulas de Literatura e Língua Portuguesa priorizam o discurso poético como forma de exercitar um olhar diferenciado sobre a realidade do aluno. A Literatura explora os horizontes que estão além dos limites das palavras, de tal maneira que ensinar acaba sendo um gesto reflexivo: o aluno é levado para dentro de si mesmo, no momento em que se identifica com outros indivíduos, sejam eles personagens literários ou protagonistas de situações da atualidade. Nesse momento, ficção e realidade atuam um em função do outro, numa alternância de signos que constrói uma síntese sobre a visão que os alunos apresentam das “coisas reais”.

Nesse sentido, a sala de aula remete à ideia principal dos antigos livros denominados “Lições de coisas”, que inspiraram o projeto poético de Drummond, de modo que procuramos, dentro desse espaço, muitas vezes, definir, cercar significados e conceitos. Contudo, não podemos esquecer que a palavra, bem como os alunos, é um ser e que precisa, portanto, de espaço, para que seja possível dar ao aluno a chance de emprestar um pouco dessa vida ao “semblante do mundo”. Somente assim, com uma constante renovação dos significados, será possível que as coisas sempre voltem a nos ensinar.

Nicolas Hyppolito Winck
Professor do Ensino Fundamental II e Ensino Médio do Colégio Pentágono